segunda-feira, 28 de novembro de 2011

NO MÍNIMO, RESPEITO

Por Antonio Guilherme Schmitz Filho

Existem coisas que a gente pensa que nunca acontecerão. Mas nada como o tempo e a necessidade de assumir dada posição para que determinados pressupostos, estabelecidos como certos, simplesmente sumam. Quem poderia imaginar que algum dia o Estádio Mané Garrincha fosse rebatizado? Faço um convite para entrarmos no túnel do tempo e colocarmo-nos na posição de um leitor da antiga Revista Manchete ou O Cruzeiro. Os feitos de Mané e companhia bordejavam as páginas e proclamavam ao povo brasileiro o significado do futebol, a sua dimensão social e nacional.

Estádio Mané Garrincha, de Brasília (Foto:Divulgação)

A condição técnica quase hermética do drible passou a ser reinterpretada. Joãos e mais Joãos foram enfileirados e tratados como bobos por um “Carlitos” inquieto e faceiro. Imaginem se algum leitor das revistas contestaria, embalado por tamanho momento criativo e singular, uma homenagem fosse qual fosse, ao irreverente jogador de pelada. O futebol, em ato quase banal, foi redesenhado por Mané. As Copas de 58 e 62 sem Mané também não teriam a menor graça. Mané se fazia Mané jogando em interação com o popular, com as coisas do dia-a-dia.

Tentativa de implosão da arquibancada não deu certo (Foto: Felipe Sampaio/IG)

Talvez a velocidade dos tempos imponha a falta de memória e de respeito. Garrincha, em rara ocasião ingressa no banco de reservas. De protagonista virou apenas um apêndice: Estádio Nacional de Brasília (Mané Garrincha). Penso que passar do banco de reservas ao banco de concreto é uma questão de tempo (ver projeto de lei/Câmara Legislativa/Comissão de Assuntos Sociais). Lá se vai Mané, como acessório qualquer. Como uma satisfação a ser dada para a coisa não configurar tão feia. Talvez mais um grande evento esportivo, com demanda da atenção mundial, e Mané assim como tantos outros, vai ao vento, bordejar o nada...

Após a reforma, mudará o nome para Estádio Nacional de Brasília (Foto:Divulgação)

Triste constatação, mas lógica verdadeira em um mundo de argamassa (projeto arquitetônico do Estádio: custo de R$ 1,6 milhões). Lugar sem espaço para a poeira dos campinhos de pelada. Espaço sem lugar para a alegria de construir e desconstruir movimentos, sem a possibilidade de ziguezaguear desafiando nexos e sentidos. Ainda iremos presenciar mais absurdos que com certeza serão recobertos por uma série infindável de justificativas (plausíveis?). Sem o tempo necessário para a apreciação, o próprio jogo perde sua essência e volta-se ao hegemônico. Os atos de nobreza esportiva, serão encobertos um a um pela preciosidade do entretenimento mercadológico.

Garrincha foi bicampeão mundial de futebol pela seleção brasileira, em 1962 e 1958 (Foto:Folha.com)

No mínimo respeito ao Mané, que a tradição e a história esportiva preservaram para as futuras gerações! Se estivéssemos na época áurea de circulação das Revistas Manchete e O Cruzeiro, provavelmente estaríamos enfrentando a maior manifestação popular de repúdio ao comportamento de políticos e administradores sem escrúpulos.



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